
No nosso "filme preferido" projectamos fantasias, existências desejadas ou temidas, mundos paralelos que traduzem de forma figurada e intensa a nossa vivência da realidade. Para muitos, um filme preferido não será a escolha mais óbvia da generalidade do público (Freaks, de Todd Browining vs. Titanic, de James Cameron, por exemplo), e a expressão "de culto" surge aqui como um código, uma espécie de segredo fora do alcance do espectador comum.
Realizadores como Roger Corman, Ed Wood e Paul Morrissey são hoje paradigmas desse "culto", mais por razões históricas do que por real mérito artístico.
Corman, o grande impulsionador dos subgéneros do cinema americano, misturando em doses maciças sexo, sangue e violência a um ritmo frenético, com baixissímos orçamentos, é o precursor dos "blockbusters", na essência e na intenção: cativar o maior número de entusiastas com o espectáculo mais excitado que se conseguir produzir. Ao longo de largas centenas de películas, Corman deu espaço de manobra e criação a nomes como Francis Ford Cappola, Jonathan Demnme, Jack Nicholson e Jonathan Kaplan, entre muitos outros.
Quentin Tarantino terá fundado muitas das suas ideias no universo de Corman e o mega-produtor Joel Silver (Arma letal, The Matrix) actua hoje de forma idêntica, quadriplicando os meios.
Ed Wood revisitou e explorou os medos obscuros de uma América em permanente sobressalto. Com recursos escassos, muita imaginação e a boa-vontade de uma equipa fiel, criou clássicos como Plan 9 From Outer Space, ou como uma invasão de alienígenas vampiros pode afectar o desenvolvimento normal de uma pacata localidade. A preto e branco, com cenários de cartão semidescolados, sombras de microfone e desempenhos mais assustadores do que o tema escolhido mas muita, muita convicção. Em Gjen ou Gjenda falou-nos de transexualidade, desempenhando o duplo papel protagonista, ora embrulhado em angorá ora levando-se dramaticamente a sério.
Inconformista, excêntrico, bizarro, Wood estava destinado a ser admirado pela audácia e pelo humor involuntário das suas criações. John Waters não existiria hoje sem a obra de Ed Wood.
Paul Morrissey acompanhou as tendências da Factory de Andy Warhol e Cia. Joel Dallessandro era então o representante de um certo ideal masculino, corrompido pelas drogas, pela prostituição e por outras declinações possíveis de má vida. Esta associação entre beleza e decadência e o jogo preverso de ambiguidades que os anos 70 proporcionavam, deu origem a filmes como Flesh, Trash e Heat, transgressores q.b, por vezes amorais, muito gráficos na representação dos corpos. O erotismo no cinema não voltaria a ser o mesmo, nem para o próprio Morrissey, que em Flesh for Frankenstein e Blood for Dracula mergulhou em fantasias carnais sem limites, regado a sangue, em ambientes de improvável terror.
Como negar o culto a estas figuras e à sua vontade indomável de criar algo novo e peculiar?...
Provavelmente um "filme de culto" não nasceu de grandes paixões, de longos debates e criticas arrebatadas. Dificilmente classificaremos JFK ou mesmo A Ultima Tentação de Cristo como tal.
Essa designação nasce do interesse de espíritos inquietos, curiosos, com uma boa dose de humor e de sentido lúdico, que, ao sabor do tempo e da descoberta, encontram histórias que se enquandram numa certa filosofia de vida. A sua. Pode haver filmes mais especiais?

4 comentários:
que este blog seja o principio de um culto...
bem vinda a este espaço, o cinema é uma paixão, a arte paixao é...
parabens...
Só tenho de enaltecer e agradecer as palavras que me foram dirigidas...sobretudo quando elas são provenientes de um...génio por lapidar!
quero mais posts
entao, andas a dormir ou ké??
preciso das tuas reflexoes :)
beijnhos
andas ocupada com os exames???
entao??
como é??
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